Sou suspeito de falar, mas adorei a entrevista do Ariano Suassuna que li no jornal e trago aqui na integra para vocês. Apesar do papo começar com Big Bosta (Big Brother) ele culminará em arianasuassunadas das boas:
Pedro Bial: Bella,
o maior escritor da história de Pernambuco é…
Bella
Maia: Ariano Suassuna!
Pedro
Bial: Ah, que bom. Espero que ele esteja ouvindo isso...
…e
estava. O escritor assistiu à edição do Big brother
Brasil na qual a recifense o citou como referência. E
gostou. No apartamento em Candeias, Jaboatão dos Guararapes, onde costuma
veranear com a família, ele deu uma pausa na fisioterapia para conversar com o
Viver sobre televisão, adaptações literárias, hábitos perdidos (devido à idade)
e o livro O jumento sedutor, que ainda escreve. O dramaturgo se recupera de um
infarto sofrido no ano passado. Mas nem parece. Está cheio de energia, de volta
às aulas-palestras e ainda guarda um tempinho para ver TV.
O que achou da resposta de
Bella Maia?
Eu
fiquei muito agradecido. Foi uma delicadeza muito grande dela em relação a mim.
Não sei quem é ela… Ela é pernambucana, né? Eu imagino que seja, porque se não
Bial não ia perguntar a ela sobre Pernambuco, especialmente. Mais um motivo,
mais um carinho que recebo do povo pernambucano. Eu sei que iam questionar. Mas
eu vou fazer a defesa dela. Bial não perguntou “qual é o maior escritor
pernambucano?”. Ele perguntou: “qual é o maior escritor da história de Pernambuco?”.
Pode-se questionar se eu sou, mas não que ela tenha dado uma resposta errada.
Porque nasci na Paraíba, mas eu pertenço à história cultural de Pernambuco
também. Eu estreei na literatura em Pernambuco. Você sabe quantos anos tenho de
vida? 86. Sabe quantos anos eu vivi na Paraíba? 15. Durante esses 15, fazia
estágio em Pernambuco. Desde os dez anos, passo mais tempo em Pernambuco, que
na Paraíba. Aqui, eu publiquei meu primeiro poema. Aos 18 anos, mais
precisamente, no dia 7 de outubro de 1945. Participei do importante Teatro
Popular do Nordeste, que fundei com meu querido amigo Hermilo Borba Filho, e
criei o Movimento Armorial aqui. Escrevi também a minha primeira peça. Vamos
tirar do assunto cultura e do assunto escritor… Se você me perguntar “quem foi
o maior político pernambucano?”, vou dizer Agamenon Magalhães. Mas “qual o
político mais importante da história de Pernambuco?”, vou responder que foi
Miguel Arraes, apesar de ele ter nascido no Ceará.
Costuma
assistir ao Big brother Brasil?
Normalmente,
não. Assisti porque estava esperando a minissérie Amores roubados. Saí da
novela que assisto regularmente, Amor à vida, e gosto. Eu quero que Aline seja
castigada. Mulher ruim da peste. Sempre fui de assistir novela. Não quer dizer
que goste de todas, tá certo? Quando vejo que é ruim, paro de assistir. A
melhor foi Lado a lado. Achei muito bem feita. Eu prefiro novela a qualquer
enlatado norte-americano. Os filmes norte-americanos que se vendem para a
televisão são péssimos. As novelas são mais bem feitas.
O que acha da adaptação de
Amores roubados?
Gosto
muito do texto, dos atores. O diálogo tá bom. E não me admiro. Se não me
engano, foi escrito por George Moura (roteirista), né? Quem eu conheço, gosto e
admiro muito.
O que acha de adaptações
literárias para televisão?
Gosto
de umas, sim, outras, não. Eu devo muito à televisão por ver espetáculos que
jamais veria. Outro dia, eu vi um concerto regido… Veja que coisa simpática: o
regente era um judeu, o pianista era um chinês “endiabrado” e uma orquestra
austríaca. Um concerto universal. Eu vi no canal chamado Arte 1. É muito bom.
Qual não o agradou?
Grande
Sertões Veredas (Guimarães Rosa) perdeu a adaptação para a televisão. Perdeu
muito. Eles fizeram uma coisa que não sei por que fizeram isso. Toda a história
se baseia no fato de que o personagem é representado como homem, mas ele é uma
mulher. Isso só se revela no fim do romance. Na televisão, eles colocaram logo
no começo. Foi estragado.
Adaptação transforma a obra
em outra?
Tem
que transformar. É outra arte. Principalmente, como no caso de A pedra do
reino, porque era romance para um espetáculo de televisão. Quando é de teatro
para televisão, ainda há parentesco. Mas do romance é uma dificuldade muito
grande. E ele venceu. Tudo o que coloquei no romance tava lá. Eu tive a
impressão que o público, por causa do sucesso de Auto da Compadecida, esperava
uma outra Compadecida…. Mas é completamente diferente. Não tem a leveza da
comédia. A maior parte é dramática. Eu nunca tive romance adaptado para o
teatro.
Qual a adaptação favorita de
sua obra?
Não
tem a de que mais gosto. Gostei muito das minhas experiências na televisão. Fui
procurado pela primeira vez em 1963, mais ou menos. Vi que eles queriam que eu
me adaptasse aos padrões. Recusei. Então fiquei 30 anos sem ter nada na
televisão. Até que fui procurado por um extraordinario diretor, chamado Luiz
Fernando Carvalho (Lavoura arcaica), e eu não tive dificuldade com ele. Ele era
entusiasta da música armorial. Eu não tive que fazer concessão. Fizemos a
adaptação da minha primeira peça, Uma mulher vestida de Sol. Fiz com ele A
farsa da boa preguiça e, por fim, Guel Arraes fez O auto da compadecida. Teve
também A pedra do reino. Gostei muito, mas acho que o público ficou
absolutamente indiferente, não gostou muito. Os espetáculos são muito bonitos.
Mas o grande público estranha.
Acha que a
televisão mudou no quesito qualidade?
Eu
acho que ela tem grandes momentos. Não gosto do que é ruim artisticamente e o
que é o grosso. O que me queixo muito dos meios de comunicação de massa é
porque eles procuram uma coisa, e eu, outra. Eles, lucro, audiência. Eu, não.
Eu gosto de arte. E, aí, normalmente, a TV comum se nivela pelo gosto médio. E
aí eu digo: o gosto médio é péssimo. Às vezes, eu digo que, entre o gosto médio
e o mau gosto, a arte tem mais a ver com o mau gosto.
Você acompanha seriado
americano?
Não.
Não quer dizer que eu não gosto indiscriminamente, não. Existe um filme em que
um autor norte-americano era apaixonado pelo México. Me identifico muito com
ele. O tesouro de Sierra Madre. Vi na TV e gostei muito.
Você acompanha o cinema
pernambucano?
Não
acompanho. Eu não vou mais a cinema. Não tenho mais tempo, nem resistência.
Por que considera o Armorial
um movimento?
É o
que ele é. O movimento é organizado por um grupo de artistas e escritores, com
características em comum, que se reúnem para mostrar que aquilo é um dos
caminhos possíveis da arte. Foi assim com o movimento modernista.
E o Tropicalismo e o Mangue?
Eu
acho pobre. Me diga uma coisa: Você já viu uma peça de teatro ou conhece um
romance tropicalista? Conhece algum poeta tropicalista? Então é mais uma onda
musical. Eu gostava muito de Chico (Science). Ele foi me procurar. Fiz críticas
a ele. Acho o maracatu rural uma coisa linda. Acho rock uma desgraça. Eu disse a
ele: gosto muito do que você tem de Chico. Mude o nome para Chico Ciência, que
eu subo no palco com você. Tenho horror esse abastardamento do português pela
língua inglesa. Hoje, inclusive, não se diz mais “tempo”. Diz fulano tem um
time. Isso é uma coisa ridícula. País sem personalidade, meu Deus.
O que acha do brega?
Eu não
tenho tempo para perder com isso. Gosto muito de Dostoiévski, Tolstói… Essas
coisas, nem me pergunte. Até o nome eu tenho antipatia….
Como está a recuperação?
Está
bem. A fisioterapeuta está me esperando para a gente continuar. Isso que estou
fazendo aqui (a entrevista) é uma extravagância. Teve esse episódio do infarto
e o aneurisma. Graças a Deus, escapei dos dois.
O senhor continua escrevendo?
Sim…
mas não posso falar muito. Meu editor pediu. É o romance O
jumento sedutor (escrito há mais de três décadas). Eu
sou mais conhecido como dramaturgo, menos como romancista e, como poeta, sou
completamente desconhecido. Nele, pela primeira vez, tô procurando fundir
teatro, romance e poesia.
Grande Suassuna! Bela e sincera entrevista!
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