Viajantes Interplanetários

domingo, 17 de abril de 2016

eu & o mar


depois de quase 20 anos
estou de volta a casa de meus pais
depois de uma saída brusca causada por uma gravidez adolescente
e de muitas outras coisas que se sucederam a partir daí, estou de volta,

vim passar uns dias por aqui, me resgatar, me reencontrar
terminar um livro que guardei durante um tempo
um tempo onde desacreditei de mim mesma
um tempo onde todas as minhas forças se concentravam para conseguir lidar com as guerras que trazia no peito

agora que a guerra finalmente acabou e os filhos cresceram (graças a deus)
e que a função materna ininterrupta 24 x 7 me deu uma trégua
liberei-me completamente para voltar para a diana que um dia fui 
eu estava desacostumada a cuidar de mim
havia esquecido como se faz isso desde que pus duas criaturas neste mundo

catarses tem acontecido diariamente,
tenho me encontrado em muitos lugares, 
lugares que já nem são mais como eu os havia guardado aqui dentro 
as lembranças da infância
as tardes passadas na praia em busca de siris ou mariscos
as brincadeiras na maré baixa
os cavalos marinhos
as muitas risadas guardadas em conchinhas feitas com minhas próprias mãos quando elas eram bem menores do que são hoje
a água escura mas nem um pouco assustadora
incrivelmente limpa e plena de vida
existem apenas da minha superfície para dentro
aqui fora está tudo mudado

ainda assim parto todas as tardes depois que o sol ameniza as cores
para encontrar o mar 
e isso tem sido incrivelmente restaurador
eu mergulho meus olhos na imensidão azul claro  
aprumo o nariz em direção ao horizonte e aspiro todo o ar que consigo 
procuro os lugares por onde andei outrora, busco estabelecer conexões com as referências que guardo em mim, 
lembranças lá do fundo preenchem uma tela paralela à tela real que se desdobra a minha volta
tudo está muito diferente

 a orla caiçara com barquinhos coloridos ancorados muito próximos a margem
é tão bom de se ver
o balé das águas azuis e toda sua delicadeza ao tocar nas pedras
compondo tranquilizadora melodia
a igrejinha onde fui batizada 
as matizes aquareladas do céu e do mar  
me fazem pensar que estou num livro de Hemingway (o velho e o mar)
sinto-me ora como o garoto Manolin ora como o velho Santiago e penso na amizade verdadeira que tenho cultivado comigo mesma,

concordo com Hemingway, a Natureza é implacável e o sofrimento é certo
mas peixes diferenciais sempre surgem
e exigem de nós um pouco mais de esforço e determinação, força, calma, perseverança,
é preciso que tenhamos coragem para enfrentar as tempestades, as noites frias, os dias mais duros, o sol a pino sobre nossas cabeças,

todos os enfrentamentos com os quais nos deparamos em nossas pescarias diárias estão aí para nos mostrar que devemos ter um enorme respeito por nós mesmos,

e enquanto peixes extra_ordinários não aparecem, temos que nos contentar e sobretudo perceber os encantos que todo o resto possui, o próprio mar, o ar, as tartarugas, as águas-vivas, a lua, o céu, a chuva, os tubarões, as profundezas, o sal, as histórias que vivemos, as adversidades que superamos,
pois
a Vida é o que há de mais precioso ao nosso alcance,
é o nosso Endless River.

bom domingo,

diana.

Um comentário:

  1. Acróstico

    Ok, talvez eu tenha esquecido
    Mas este mar está ali a espera
    Assim como fora ou teria sido
    Refluxo que lembra o que era.

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