Tinha razão o rapaz de ficar zangado. Mas com um pouco de imaginação e bom humor podemos pensar que uma das delícias do gênio carioca é exatamente esta frase: – Ele foi tomar café.
A vida é triste e complicada. Diariamente é
preciso falar com um número excessivo de pessoas. O remédio é ir tomar um “cafezinho”.
Para quem espera nervosamente, esse “cafezinho” é qualquer coisa infinita e
torturante. Depois de esperar duas ou três horas dá vontade de dizer: – Bem,
cavalheiro, eu me retiro. Naturalmente o Sr. Bonifácio morreu afogado no
cafezinho.
Ah, sim, mergulhemos de corpo e alma no
cafezinho. Sim, deixemos em todos os lugares este recado simples e vago: – Ele
saiu para tomar um café e disse que volta já.
Quando a Bem-amada vier com seus
olhos tristes e perguntar: – Ele está? – alguém dará o nosso recado sem endereço.
Quando vier o amigo e quando vier o credor, e quando vier o parente, e quando
vier a tristeza, e quando a morte vier, o recado será o mesmo: – Ele disse que
ia tomar um cafezinho... Podemos, ainda, deixar o chapéu. Devemos até comprar um
chapéu especialmente para deixá-lo. Assim dirão: – Ele foi tomar um café. Com
certeza volta logo. O chapéu dele está aí... Ah! Fujamos assim, sem drama, sem
tristeza, fujamos assim. A vida é complicada demais. Gastamos muito pensamento,
muito sentimento, muita palavra. O melhor é não estar. Quando vier a grande
hora de nosso destino nós teremos saído há uns cinco minutos para tomar um
café. Vamos, vamos tomar um cafezinho.
Rio,
1939.
(BRAGA, Rubem. O Conde e o passarinho & Morro do isolamento.
Rio de Janeiro: Record, 2002. p.156-7)