Haicais de Domingo
Teresa Cristina Flordecaju
”Desce daí, menina levada”, ouviu do pai, quando pequena de cima de um cajueiro. Poucos instantes depois estava no chão e foi socorrida por Inocência, sua mãe. Quem sabe esse episódio foi a centelha que acendeu a vontade de inflamar as folhas com poesias, prosas e contos.
Depois da capela
Uma casinha no morro
de portas abertas
Natural do estado de Piauí, Teresa Cristina, além de haicaísta que tem o respeito de muitos na blogosfera, é professora de escola pública na zona rural. Orgulhosa da profissão, estando hoje na gestão da escola, dedica-se também aos filhos e netos.
Manhã de março -
Os mandacarus abrem
suas brancas flores
Em seu espaço Haicai e conversa poética a autora deposita seus poemetos sempre bem acompanhados por imagens lindas. Unidas, proporcionam a devida paz a quem se dispõe a lê-la.
Flores na janela –
Passa uma borboleta
bem devagar
Apaixonada pela leitura, ela mostra que o amor pelos livros pode superar, sem dúvida, a falta de tempo. Sobretudo para a autora que fica comumente sobrecarregada por conta do magistério.
Numa conversa bem descontraída, ela nos falou um pouco de si, muito bem humorada e com um astral celeste.
HD: Notamos na sua poesia uma sensibilidade e percepção notável para com os elementos que compõem a natureza. Esse componente (a natureza) pode ser considerado, principal estimulante de sua escrita?
Teresa: A natureza sempre me falou de suas cores, sabores, cheiros, talvez por eu ter crescido numa casa com plantas como cajueiro, mangueira, goiabeira. Lembro-me de gostar de brincar em cima das árvores e fingir que era um pássaro.
Fundo do quintal –
Na lama da chuva fina
uma minhoca
HD: Quando foi que aconteceu o seu primeiro contato com os minúsculos poemas, o qual chamamos de haicais?
Teresa: Onde moro não há livrarias ou editoras e a Internet só me passou a ser um meio de comunicação em 2008. E foi nessa data que conheci o poeta piauiense Luciano Almeida (falecido em 2009) que me mostrou a concisão e também a grande expressividade do haicai.
Noite de luar
O miado de um gato
pulsa na janela
HD: Que tipo de leitura mais a agrada: os contos, poesias, crônicas ou você é pura e exclusivamente ligada aos haicais?
Teresa: Hum... (risos) sou daquelas pessoas que tudo que vê na natureza logo relaciona ao haicai, mas tenho um caso de amor com a literatura infantil. Sabe, eu fui daquelas crianças que adorava ficar horas na biblioteca municipal lendo os contos maravilhosos. Muito embora meu pai não achasse que esse tipo de leitura fosse importante para a educação. Um dia, a bibliotecária me pegou lendo Peter Pan e contou a meu pai. Levei uma bronca e fui proibida de ir à biblioteca quando não tivesse pesquisa da escola. E falando dessas lembranças, o caso de Peter Pan foi de paixão mesmo. Aos 36 anos, já divorciada, comprei o DVD desse personagem e o assisti com meus 4 filhos. Foi um momento ímpar para mim.
Sua devoção aos familiares e às crianças que convivem com ela nas salas de aula do interior certamente ainda a influenciaram na poesia infantil que elabora com bastante responsabilidade...
Era uma vez uma joaninha
de capa vermelha com bolinhas pretas
Vivia sozinha num pomar
E não tinha com quem conversar
As irmãs casaram
Os pais voltaram para o interior
Sábados e domingos
Ficava quieta dormindo
Então, numa noite sem sono
Perambulou por um jardim
Foi assim que descobriu uma amiga
A linda flor margarida
Teresa Cristina Flordecaju
Que seus versos cajuínos não cessem e nos adocem as vidas a cada dia.
Cristiano Marcell é professor nas horas vagas e escreve no blogs http://esquifedememorias.blogspot.com e http://haicaienaomachuca.blogspt.com