Viajantes Interplanetários

segunda-feira, 8 de abril de 2013

INDEPENDÊNCIA OU MORTE


        No Brasil, a literatura independente constitui um movimento sem contorno claramente definido ou delineado. Há uma grande diversidade de grupos e poetas. Eu vou falar alguma coisa dentro da minha visão pessoal, do meu gosto pessoal.


Nesse troço de poesia alternativa não parece haver uma preocupação exclusiva ou especificamente estética. A poesia, aí, é parte de um projeto existencial-ideológico que corre à revelia da tradição conservadora em geral. Se o projeto é utópico, isso já é outra história. A obra individual tem a sua importância, porém secundária. Há um engajamento à esquerda, assumido em boa parte dos poetas, embora o panfletarismo seja evitado. Se na poesia tradicional percebe-se uma certa preocupação em esconder nuances do jogo do poder, na poesia marginal o que há é uma espécie de ataque frontal aos mecanismos de poder em geral. Nela, o mais importante não é o artesanato de palavras em si mesmo, a competência linguístico-formal, porém a literatura como ferramenta ou como ponte para algo maior: expansão da consciência, pesquisa “ontológica”, combate ideológico, exposição de entranhas vitais, aprofundamento da autopercepção e da visão crítica, etc. Outro lance muito caro para a poesia independente é o combate à separação entre arte e vida. A supervalorização do aspecto estético é uma conseqüência dessa separação. O Artaud já dizia que era preciso "destruir a arte para tocar na vida". A tradição reacionária cultivou e, em sua maior parte, ainda cultiva uma espécie de torre de marfim intelectualóide, desligada da realidade concreta. Com os poetas marginais, o que vai acontecer é um mergulho no cotidiano, na vida mesmo, com toda a sua ferocidade. Na linguagem coloquial. Em algum tipo de anti-arte. Na desierarquização estética. No erotismo explícito. Na coragem para expor as tripas da condição humana, nua e crua. Daí que muitos poemas são flashes do dia-a-dia, flertes com letras de música, notas de intuições; e a obra, um registro de processo vital.


Outra referência importante é a herança contracultural, com as suas experimentações, seus diversos matizes, a espiritualidade oriental, etc. No ataque ao tradicionalismo, o choque alternativo é bem mais fundo, mais amplo, mais visceral que o choque modernista. Em relação ao regional, há ambigüidade. Se, por um lado, há uma valorização das raízes, por outro existe a preocupação em criticar aspectos conservadores da herança regional, principalmente no nível existencial, ou no que se refere à rigidez de algumas "manifestações" populares. Cultiva-se um regionalismo antropofágico e crítico, por assim dizer, aberto para a assimilação de avanços cosmopolitas. Não um regionalismo xenófobo e "careta" ou um folclore asséptico e acrítico, nem o regional pelo regional.


As edições sofisticaram-se e vão desde o off-set até o computador, ou mesmo alguma grande editora, uma vez que o conteúdo e o tráfico de idéias são encarados como mais importantes que o veículo, desde que não haja cortes ou modificações no texto.


Lara 
OBS: em bereve no Castanha Mecânica

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Limerique

    Lembre, se estás à margem meta o pau
    Ponha boca no mundo, grite, escambau
    Porque a onça só surta
    Cutucada com vara curta
    Mostre ao mundo que é poeta marginal.

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