“O livro
é bem melhor que o filme!”.
Quantas
vezes escutamos isto nas habituais conversas que travamos quando o assunto é
cinema? O que é, claro, uma informação óbvia. Não tem como o cinema ter a mesma
profundidade de descrições físicas, psicológicas, reflexões existenciais da
literatura, mesmo porque o estilo literário é muito diverso do cinematográfico.
Outra coisa que as pessoas não entendem é que quando o livro é transposto para
as telonas ele será “adaptado” pelo roteirista, ou seja, em hipótese alguma, a
estória será contada integralmente. Se acontecesse isto, certamente tornaria o
filme um maçante entretenimento.
Muitas
vezes os filmes também não são fiéis às obras que se baseiam, acreditem, para a
nossa felicidade. Um filme deve ser analisado como um filme e não comparado com
a obra que deu origem à sua produção e se o roteirista, com alguma boa
probabilidade de acerto, não incluiu determinada situação na trama é porque
julgou desnecessário ou até mesmo prejudicial ao andamento da estória. Aqueles
que tiveram fidelidade estrita fecharam-se num hermetismo que até mesmo os
leitores não gostaram ou entenderam e poucas vezes funcionaram
cinematograficamente. O que deve acontecer na película é a tradução das
palavras do livro em imagens, assim como na arte de escrever roteiros também se
espera que contem-se estórias através de imagens prioritariamente.
Existem
os livros que sequer conhecemos e descobrimos de que se tratam de adaptações, outros
que viram best sellers e tornam-se alvos imediatos dos ambiciosos produtores
hollywoodianos. Qualidade literária não é certeza de que vá se tornar um grande
filme. Muitas vezes a narrativa apenas funcione na forma escrita e não no
aspecto visual. Nem todos os livros que ganham versões para as telonas são
exatamente bons, vide os da Saga
Crepúsculo que renderam milhões nas bilheterias e também milhões de pessoas
que o odeiam como fenômeno literário e cinematográfico.
Alfred
Hitchcock já citou uma vez que livros ruins sempre resultam em filmes interessantes.
Seus maiores clássicos originaram-se de livros obscuros que passaram
despercebidos nas prateleiras das livrarias, como, por exemplo, Psicose. E poucos diretores entendiam
tão bem como contar uma estória como o mestre do suspense.
Já
aconteceu dos filmes tornarem-se mais famosos do que os livros adaptados. Morte em Veneza é frequentemente lembrado
como um clássico de Luchino Visconti do que uma das mais célebres obras
escritas pelo alemão Thomas Mann. Outras obras tiveram que esperar décadas para
serem vistas nos ecrãs de todo o mundo, pois a tecnologia da época ainda não
permitia a adaptação, como por exemplo, O
Senhor dos Anéis de J. R. R. Tolkien. Existem aqueles filmes que de tão
densos, lembram e muito obras oriundas da literatura, como grande parte da
filmografia do sueco Ingmar Bergman, que também teve enorme influência do
teatro na sua escrita e direção.
Nossos
clássicos nos proporcionaram algumas ótimas transposições. Macunaíma, de Joaquim Pedro de Andrade talvez seja a mais
representativa de todas elas, pelo menos a mais pop das que já foram produzidas até hoje (a mistura de psicodelia,
Tropicalismo, inspiração kitsch entre
tantas referências que devem ter feito Mário de Andrade ficar feliz com a
versão de seu romance). Além de Vidas
Secas, de Nelson Pereira dos Santos, que traz quase o mesmo impacto do
romance de Graciliano Ramos. Ambas obras-primas deste momento único em nosso
filmografia que foi o Cinema Novo.
Muitas pessoas leem
os livros, pois viram o filme antes no cinema. E, aqui entra uma impressão
pessoal, acredito que antes de desenharem uma personagem com a sua imaginação,
veio à cabeça do leitor o semblante do ator ou atriz que interpretou o
protagonista. Eu já sofri demais com esta situação, apesar disto não me
atrapalhar de gostar ou não do livro. Quando o livro é muito bom a gente
esquece até mesmo aquele filme que te marcou. E aí a literatura marca mais um
ponto: quando lemos um livro e vemos posteriormente a sua adaptação, o risco de
não gostarmos é maior. Por quê?
O fato de surgir em sua mente a
afirmativa do início desta coluna.
Caro Wesley,
ResponderExcluirGosto muito de teus textos cinemais porque você tem a facilidade de "colocar o dedo na ferida", escreve com leveza e vende o peixe com competência. É particularmente difícil explicar, como você o fez muito bem, a diferença entre o livro e sua versão na telona. Sempre que leio e gosto de um livro não costumo ver sua versão cinematográfica porque fico comparando e acabo não gostando. Quando não li o livro vejo o filme e geralmente gosto. O único filme que ficou absolutamente igual ao livro foi "A menina do fim da rua" onde estreou a garotinha Jodie Foster e tinha Martin Sheen como personagem. Parabéns pela suculenta postagem, JAIR.
Muito obrigado, Jair!
ExcluirAgora você me deixou curioso pra ver este filme com a Jodie Foster em sua estreia rsrsrs
Um grande abraço!
Muito bom ler seus textos. Eu adoro cinema eadoroliteratura. Este ficou show!!Abraços.
ResponderExcluirValeu, Regina!
ExcluirNão tem como dizer qual das duas artes é a mais encantadora, acredito que ambas se complementem. Compartilho da sua mesma paixão.
Um grande abraço!
Excelente, caro amigo!
ResponderExcluirObrigado, Cristiano!
ExcluirLembrando que a ideia do post foi sua e do Fred Caju, acabei aproveitando a dica.
Um grande abraço!
Ideia nossa e talento exclusivo seu!
ExcluirAcho que há espaço para apreciar o livro e o filme, sem ficar comparando. Mesmo numa adaptação longa, como foi o Senhor dos Anéis sempre falta alguma coisa, mas não é por isso que o filme é ruim.
ResponderExcluirRealmente, Fabio.
ExcluirA culpa não é do cinema, infelizmente é preciso cortar muita coisa do livro para que este apareça em sua essência na tela.
Um grande abraço!
Olá Wesley, com esse texto esclarecedor você me deu a oportunidade de entender sobre meus porques de não gostar das adaptções do livro para o cinema. Você é mestre no assunto! Parabéns!Beijos!
ResponderExcluirMuito obrigado, Vilma!
ResponderExcluirComo o Fabio apontou no comentário acima, sempre vai faltar algo na adaptação para cinema de uma obra literária. Mas se o filme é bom a gente esquece este detalhe rsrs
Beijos!
Boa, Wesley! Gostei de como você tocou na questão. Fiquei curioso com algumas predileções suas...
ResponderExcluirMuito bom cara!
ResponderExcluirVidas secas é um filme seco, do geito q eu gosto - um tapa na cara, até agora tenho o rangido do carro de boi no juízo
"(...)O que deve acontecer na película é a tradução das palavras do livro em imagens(...)"
ResponderExcluirPerfeita colocação Wesley! Quando surgirem as futuras comparações no pensamento, vou lhe plagiar. :P
O assunto é polêmico e divide seriamente as opiniões. Assim como essa questão que você levantou de qualidade literária e do que são comumente chamados os livros bons.
Como sempre, adorei o post, Parabéns.
:*